A adaptabilidade de Pep
No mundo do futebol, poucos treinadores tem ideias tão claras do que pretendem que suas equipes façam quanto Pep Guardiola. Sua obsessão pela posse de bola, a partir da qual exerce o jogo de posição - seu principal conceito - é marcante. Entretanto, nessa terça, diante do Barcelona, o cenário desfavorável fez Pep (que por vezes é taxado de ególatra) abrir mão de suas quase que inalienáveis convicções para conduzir o Manchester City a uma grande vitória. Duas semanas após os 4 a 0 sofridos na Catalunha, os Citizens novamente apostaram na marcação alta como forma de conter a enorme qualidade blaugrana e buscar ter a posse de bola. Contudo, a eficiência da saída do Barça regeu a maior parte do 1º tempo. A partir do excelente jogo com os pés de Ter Stegen, a equipe de Luis Enrique teve muita retenção e conseguiu controlar um City incomodado em ter de correr atrás da bola por muito tempo. Não foi surpreendente, portanto, quando Messi e Neymar construíram o contra-ataque letal que terminou no gol do argentino. O tento potencializou o domínio do Barcelona, que chegou a ter mais de 70% de posse na primeira etapa. Todavia, da mesma forma que no jogo do Camp Nou, mas agora no lado inverso, uma falha individual alterou de maneira drástica o curso da partida: Pressionado pela incansável marcação alta do City, Sergio Roberto errou passe em faixa perigosíssima do gramado e permitiu a ótima troca de passes que resultou no gol de Gündogan. Novos contornos eram dados a um jogo que apresentava-se extremamente favorável aos culés. Foi na volta para a segunda etapa que Guardiola promoveu uma alteração improvável para seus ideais de futebol, mas apropriada e determinante para o confronto dessa terça. Aceitando o protagonismo do Barça, Pep apostou no jogo reativo: colocou De Bruyne no comando de ataque e trouxe David Silva para a ponta esquerda, formando duas linhas de quatro e investindo nos contra-ataques. Apesar disso, a marcação alta continuou presente, mas agora de forma zonal e mais organizada. O domínio da partida mudou de lado. Mesmo antes do belo gol de falta do excepcional De Bruyne, o City já passava a dificultar muito a vida de um Barcelona que havia atuado tranquilamente no 1º tempo. Com setores distantes e muitos erros na saída de bola, a equipe de Luis Enrique pouco produziu na segunda etapa. O gol perdido por André Gomes, após jogada fenomenal de Luis Suárez, acabou sendo um lance esporádico em um contexto amplamente favorável ao City. No final, Gündogan - que revive seus melhores momentos da época de Borussia Dortmund - sacramentou a vitória inglesa. É simplesmente impossível dissociar o triunfo Citizen da adaptabilidade à qual Guardiola se submeteu. Sua audácia e humildade em romper temporariamente com alguns dos conceitos que tanto preza foi determinante para alterar o panorâma da partida, em que seu Manchester City era dominado pela equipe com maior qualidade no terço final do mundo. Foi uma resposta àqueles que tanto o criticam por, supostamente, trabalhar sempre da mesma forma e não ter “cartas na manga”. Foi a prova de que, por vezes, precisamos abdicar de nossas mais intocáveis convicções para sermos bem sucedidos.

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