Um ouro de várias facetas
O futebol passou por grandes transformações nos últimos anos. Agora os espaços são escassos, e muitas vezes a qualidade técnica não consegue se sobressair justamente por causa disso. Qualquer equipe que jogue bem organizada, com linhas próximas, consegue dificultar o trabalho do adversário, não importando o quão superior tecnicamente este seja. Foi o que aconteceu nos empates do Brasil contra África do Sul e Iraque, que resultaram em críticas vorazes - e em grande parte infundadas - à seleção nas redes sociais.
Uma dessas críticas foi em relação à suposta falta de vontade e comprometimento da equipe - um argumento absurdo, típico da nossa cultura, e que sempre é o primeiro a vir à tona quando os resultados não são os esperados. Ao invés de buscar entender com maior profundidade o que acontece, o brasileiro abusa de argumentos rasos para tentar justificar as coisas. Até mesmo quando se trata de algo tão popular em nosso país, como é o futebol.
Nunca faltou vontade para essa seleção olímpica. A aplicação de Gabriel Jesus, os carrinhos de Renato Augusto, a vibração a cada bola roubada e o próprio nervosismo das duas primeiras partidas são a prova disso. As dificuldades eram outras: a enorme pressão que reside sobre qualquer atleta que vestir a amarelinha depois dos 7 a 1, a relativa inexperiência dos jogadores, a escassez de lideranças na equipe, o pouco tempo de treino para aderir às boas ideias de Rogério Micale, entre outras questões um pouco mais complexas do que simples falta de gana.
Apesar de todos esses desafios, felizmente o saldo acabou sendo extremamente positivo. A partir do jogo contra a Dinamarca, o Brasil foi muito consistente e maduro para superar seus adversários. E a humildade de Micale em reconhecer as dificuldades da equipe e mudar suas antigas convicções foi fundamental nesse processo. Com as entradas dos gremistas Wallace e Luan, o Brasil finalmente se encontrou. O desempenho de Neymar melhorou jogando por dentro junto a Luan, os dois "Gabrieis" se esforçaram muito pelos lados - ainda que tecnicamente não tenham sido brilhantes -, Renato Augusto cresceu jogando ao lado de Wallace, e a defesa permaneceu intocável. A seleção teve infiltrações, amplitude, profundidade, conceitos essenciais do futebol moderno. Além disso, utilizou alternativas para saída de jogo características das principais equipes do futebol mundial - como a aproximação do volante para o avanço do lateral (movimento que a Alemanha utilizou na Eurocopa) e a já tradicional saída com uma linha de três.
No fim, a conquista dessa seleção vai além do ouro que bate na trave desde 1984. Ela conseguiu resgatar, pelo menos parcialmente, o orgulho do brasileiro, além de criar um alicerce para Tite iniciar seu trabalho de reconstrução da seleção principal. Sem dúvida, além da presença de alguns dos jovens atletas que fizeram parte do time de Micale, iremos ver em campo nas Eliminatórias alguns conceitos do treinador baiano, dos quais Tite também é adepto.
Bom entender com mais profundidade técnica o que realmente aconteceu à seleção para esta conquista. Fica o sentimento de um caminho reencontrado; desejo sequência.
ResponderExcluir